O turista desavisado
que chegasse ao Vale do Curicó encontraria uma paisagem árida, sem cor, sem
atrações. Em pouco tempo descobriria que estava enganado. Na terra
aparentemente seca e áspera extensos vinhedos se multiplicam, simétricos,
intermináveis, mimetizados em sua cor pardacenta. O nosso turista mudaria de
opinião ao contemplar os troncos retorcidos e secos das videiras centenárias.
Aí ele descobriria a mágica que se esconde nessa paisagem aparentemente
monótona que produz um dos maiores milagres da natureza: o vinho.
E era de vinho que
iríamos tratar. Conduzidos por dois “chiflados” aventureiros, chegamos ao Vale
em uma linda e ensolarada manhã. O nome do hotel - Raices - completava o
quadro. Uma construção baixa, de estilo colonial, sem escadas, elevadores,
corredores sem fim. Atendidos por funcionários eficientes e discretos, o hotel
nos proporcionava o ambiente descontraído e discreto para que nos pudéssemos
concentrar naquilo que realmente contava: o vinho. A primeira visita foi à Casa
Silva, vinícola que produz vinhos premiados em muita exposições internacionais.
O responsável por esse sucesso é o enólogo Mario Geisse, que, junto com os
filhos Daniel e Rodrigo, fundou a Cave Geisse, na Serra Gaúcha, que também vem
conquistando prêmios no exterior. Na degustação, além dos famosos tintos,
destacamos um vinho branco: o Sauvignon Gris. No vinhedo desta uva, próximo ao
prédio principal, uma placa nos informa:
“Sauvignon Gris - Ano do
plantio: 1912 - Espaçamento:1,0 x 1,5 m
No dia seguinte
visitamos a Miguel Torres, prestigiosa vinícola que produz o Manso de Velazco e
o Superunda, onde recebemos um tratamento especial e, no almoço, fomos
brindados com uma original “cozinha participativa”. Fomos divididos em grupos
de três e cada grupo, sob o comando de
um chef, observou a elaboração de um prato.
Em seguida cada participante elaborava , por sua vez, o mesmo prato o qual
seguiria para ser servido no almoço. Tudo sincronizado à perfeição, uma
insuperável aula de gastronomia ministrada pelos chefs da Miguel Torres. Vale
destacar que o restaurante da Miguel Torres é considerado o melhor do país, dentro de uma vinícola.
Sucederam-se as visitas
à Baron Philippe Rotschild, produtora do famoso Escudo Rojo, emblema da tradicional família de banqueiros
e, em seguida, à Almaviva, outro ponto alto da nossa expedição. Em ambas fomos
recebidos com muito carinho e atenção, o que fez com que nos sentíssemos velhos
amigos. Em todas elas as degustações foram generosas e a exposição dos
processos de produção sempre franca e totalmente aberta, o que mostra o prestígio
e a confiança de que a corajosa Flajur Turismo desfruta junto às vinícolas
chilenas.
Do ponto de vista
gastronômico – recreativo, a expedição
nos reservaria um programa surpresa que, posso dizer foi um dos mais
emocionantes que passei em toda a minha vida. Em Santiago: “Um dia na
Cordilheira” A longa subida até três mil metros de altura, por uma estrada
tortuosa, entre picos e abismos, pontilhada por placas de neve que ainda
resistiam ao abrasador sol do quase verão, foi de tirar o fôlego. Literalmente.
Porque todos sabem que nessa altura
sobre o nível do mar, qualquer movimento do corpo equivale a um esforço
dobrado. Chegados ao topo, a visão dos penhascos oferecia um espetáculo
deslumbrante, que conduzia a um estado contemplativo. Fazia-se mister encontrar
um lugar adequado para repousar a carcaça já combalida pelas atividades
precedentes e, não menos importante, fazer chegar ao estômago algo que o
tranquilizasse posto que o relógio, de há muito, havia batido as 2 horas da
tarde. Enquanto aguardava, meu olhar percorria
a gigantesca montanha, com suas escarpas íngremes e pedregosas, cheias
de mistério. Não soprava mais o vento gelado do inverno. O sol era abrasador.
Pensativo, veio-me à memória a canção que costumava ouvir em outras épocas:
Que sabes de cordillera
Si tu nasciste tan lejos
Hay que conocer la piedra
Que corona el ventisquero
Hay que recorrer callando
Los atajos del silencio
Y cortar por las orillas
De los lagos cumbrereños...
Mi padre anduvo su vida
Por entre piedras y
cerros...
O tempo passava. Eu estava esfomeado. A vista ficando turva. Por momentos pensei em ficar ali e deixar-me
petrificar entre as placas de neve que
ainda resistiam em algum flanco da encosta. A canção produzira seu efeito.
Consciente, recuperei-me e me lembrei de que aquilo era somente um passeio. Um
passeio? Foi o que pensei mas logo descobriria que aquilo não era simplesmente
um passeio.
Depois de alguma caminhada chegamos, finalmente,
a um patamar esculpido na encosta onde três ou quatro abrigos ofereciam
mesinhas e bancos talhados na pedra. À volta tudo era sol. Sentei-me num deles
e fechei os olhos com a intenção de repousar. Mais uma vez o tempo passou.
Voltei à mim e mal pude acreditar no que via. Em um abrigo próximo, a dupla de “chiflados” montava o seu templo gastronômico. Um fogão,
extraído das entranhas da terra, apareceu por encanto sobre a mesinha de pedra.
Sobre ele, uma enorme panela. Facas, tábuas e apetrechos diversos saiam de
bornais nunca antes vistos. Polvos, lulas, centollas e mariscos de todo o tipo
eram limpos e esmiuçados pelas facas habilmente brandidas. Um aroma de mar
inebriava o ambiente ... a três mil metros de altura!
Logo começaram a chegar à nossa mesa as
primeiras iguarias, acompanhadas do inseparável companheiro: o vinho. Eu
espiava tudo, sem acreditar. Jurandyr
agitava os braços brandindo as armas, esticava o pescoço, gritava
ordens, virava sobre os calcanhares, executando uma coreografia diabólica.
Terminada a pajelança, declarou pronto o
panelão, para que fosse servido. Eu, restaurado
moral e fisicamente,
recuperei a confiança na humanidade.
Nova experiência eletrizante nos
aguardava ainda em Santiago. Chegamos ao hotel, uma construção convencional sem
maiores atrativos se não fosse o seu ar majestático e sua decoração no melhor estilo hindu. Situado em pleno
centro, o que significa estar próximo à Plaza de Armas e ao Palacio de La Moneda.
Tratava-se, portanto, de uma ótima
localização para políticos e homens de negócios. Aparte o fascínio exercido
pela decoração hindu, à qual se somava o delicioso cheiro de curry que exalava do seu restaurante, não
dava para entender a sua localização. Soube depois que a escolha resultara de
uma falha ocorrida durante a operação de magia que pautava o processo
decisório. Não se sabe como, a fada que deveria dar o toque final com sua
varinha mágica foi substituída por uma bruxa má.
E deu no que deu.
Entrei no meu quarto. Era minúsculo e,
portanto, acolhedor. E foi suficiente para abrigar as malas debaixo da cama e
colocar o relógio e o celular sobre a mesinha de cabeceira. Outra coisa boa:
não havia, no banheiro, aqueles malditos mini sabonetes que só fazem
atrapalhar. No seu lugar um lindo provedor de sabão líquido colado junto à pia.
Ademais, fomos regalados pela “Fla Jur
Turismo” com um rico sabonete de tamanho
normal, acompanhado de uma linda saboneteira. Quem estava sozinho no quarto,
obviamente recebeu meio sabonete , prova de que a Flajur aplica seus recursos de maneira consciente.
Procurei uma janela para ver o que havia
à minha volta. Eu tinha notado que, existia, bem na frente do hotel, um
movimentadíssimo ponto de ônibus e
estava curioso para ver como a galera santiagueña se virava na hora do “rush”.
Encontrei a janela, era bem grande,
fechada por uma cortina, dessas de correr, vertical. Levantei a cortina, surgiu
uma grande parede de vidro e, do outro lado ... surpresa! uma linda sala de
estar, com mesinhas, poltronas e quadros na parede. Entusiasmado com a
engenhosidade do arquiteto, procurei o caminho para chegar a ela mas não o
encontrei. Achei bom pois, assim, eu não precisaria dividir com ninguém a linda
paisagem que eu contemplava da minha janela. Orgulhoso com as minhas
descobertas, chamei a atenção da minha esposa para a majestade do nosso hotel e
mostrei o nosso quarto como exemplo bem sucedido de minimalismo, tão de moda em
nossos dias.
“In vino veritas” , queridos amigos.
Este não faltou. Foram sete dias alegres, bem vividos, onde aprendemos muito e
de tudo, onde aprendemos a cultivar a convivência, o relacionamento fraternal,
praticando a tolerância e a solidariedade, o respeito às ideias conflitantes, a
criar a verdadeira amizade, incondicional. Parabéns a todos. Parabéns ao Fla, ao
Jur, e à “Fla Jur Turismo”. Parabéns às Vinícolas, às videiras e seus frutos e .... ao Vinho!
Lembrete: “ Se você busca aventuras
procure a “Fla Jur Turismo”