TRABALHO E DIVERTIMENTO
PARTE 1
Esta história começa bem longe no tempo.
Era o ano de 1948. Aos 18 anos de idade, eu completava o Curso Técnico de Mecânica
de Máquinas ministrado pela Escola Técnica do Recife, uma Escola da rede federal, criada pelo
Presidente Nilo Peçanha. Ficava no Derby, bem na beira do romântico Rio Capibaribe.
Entrei de férias e comecei a pensar no
que iria fazer na vida.
Poucos dias depois, o Diretor da Escola,
Manoel Viana de Vasconcellos mandou-me chamar e disse:
Fui informado que o Senai vai criar um
curso de Tecnologia Têxtil. Será no Rio de Janeiro, o primeiro no Brasil e concorrerão
alunos de todos os Estados. Para Pernambuco foram reservados 4 alunos. Eu
indiquei você.
O curso é gratuito e a Escola dispõe
de um Internato para acomodar os alunos de fora. Serão pagas as passagens de
ida e volta, bem como as férias, tanto as de Julho como as de fim de ano. Você
terá que fazer um exame de seleção pois só irá um dos 4 indicados. Apresente-se
no Colégio dos Jesuíta, na Boa Vista, e faça a sua inscrição. Fiz e passei. E
viajei para o Rio de Janeiro.
Com o entusiasmo e a exaltação de quem
vai fazer sua primeira viagem interplanetária, embarquei num DC3 da
Real Transportes Aéreos. Depois de 8
horas de viagem entre Recife e o Rio de Janeiro, o avião desabou sobre a pista
do antigo Galeão.
Minhas emoções apenas começavam. A
Escola começou a definir-se. O carro que
me trouxe do Aeroporto depositou-me num casarão da rua Bela, em São Cristóvão. Ali
ficaríamos até que fosse efetuado novo exame
de seleção. Os reprovados seriam devolvidos aos seus Estados.
Fiz o exame. Tirei o primeiro lugar.
Meu número de matrícula foi 1.
Foram aprovados 32 candidatos.
Formava-se, assim, a primeira turma da
ETIQT.
A Escola iniciava as aulas apenas com sua
estrutura de concreto, poucas paredes e muitos andaimes. Não havia portas nem
janelas. O piso era laje bruta. O barulho das betoneiras interrompia o
professor que ora fitava o chão ora levantava o olhar para os céus esperando
sua vez de falar.
O regime era duro: quatro horas de
aulas teóricas pela manhã, quatro horas de aulas práticas à tarde e, à noite,
estudo dirigido, obrigatório, de duas horas. Ao meio dia, o Alfredo, um garçom
com cara de mordomo inglês, metido em uma espécie de fraque e gravata
borboleta, servia o almoço.
O Diretor da Escola era o professor Mario
Souto Lyra, formado pelo Instituto Lowell, da Carolina do Norte. Da mesma Escola,
vinha o professor de Tecelagem, Horst Gaensli que também ocupava uma Diretoria
na Fábrica Bangu. Não há como deixar de mencionar outros professores da época e
o faço sabendo que vou omitir nomes importantes pois valho-me da memória: O
professor Oldegar Vieira, de Português, introdutor do Hai kai no Brasil que
fundou o Caetés – Centro Acadêmico dos Estudantes; Deolindo Dominguez Vicente,
na Fiação, com seu sotaque espanhol; Ivo
Piccoli, professor de Física, criador do “suprassumo do extrato do graveto seco”;
Manir Japor, de Matemática, com sua muleta e perna engessada que duraram seis
meses; Henrique Mariani no Desenho Têxtil e suas gigantescas e sufocantes
folhas de papel milimetrado; Emil
Kwaiser, com sotaque austríaco, ensinava Mecânica Aplicada, era também professor
de balística na Escola Técnica do Exército;
o professor Rocha, de Inglês, irmão de Carlito Rocha, o famoso treinador
do Botafogo; Dom Gerardo, frade do Mosteiro
de São Bento, no Rio, na Cadeira de História das Artes, nos ensinou a apreciar
Giotto e Caravaggio.
Amei conhecer os personagens cativantes que compunham o corpo docente do ETIQT! Imaginar a emoção de embarcar nessa “viajem interplanetária” em direção à vibrante capital carioca é um convite irresistível para reviver essa experiência única e valiosa. E que sorte a nossa contar com o relato do aluno de matrícula número 1 em nossa família, revelando os detalhes fascinantes por trás da criação desse curso técnico!
ResponderExcluirObrigado Thais pela interpretação dos meus sentimentos, o que muito me alegra e enobrece. Os três anos que passei no prédio da Escola foram gratificantes. Filho de operário, não tinha dinheiro nem para o cinema.. Vivia da Escola e do resultado dos meus estudos. Isto veremos na continuação da crônica.
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