Severino Mandacaru emergiu dessa
Pandemonia sem acento nem endereço e mandou-me uma mensagem digna de um
escoteiro de Cabaceiras:
“ Seu galego bexiguento, você sumiu,
onde você se meteu?”
Expliquei-lhe que havia subido a Serra a
convite do meu filho, que queria tirar-me
desta solidão Pandemoniaca (sem acento nem endereço), deste confinamento
cruel, desta solidão, desta imobilidade silenciosa e levar-me para um lugar que
tem tudo isso mas a vida é diferente; é mais humana, disciplinada, alegre,
festiva e em contato permanente com a natureza.
“Estou feliz, Severino, e pretendo ficar
por lá o resto da vida. E você, o que tem feito?”
“Saí de Cabaceiras. As pessoas não comem
mais macaxeira. Agora é só hotidogui, poteito,
. . . . e é tudo entregue no cangote de uma motocicleta. Vim pra Recife
e estou pensando seguir o conselho daquele garoto, o neto do Haineken, lembra,
que veio ao Recife e queria fabricar umas biritas com a mandioca brava? Estou
pensando em fabricar cerveja . . . .
. . . . Ontem estive com o velho
Ascenso. Encontrei-o, como sempre, na beira do Cais do Apolo. Ele mandou um
abraço pra você.”
Veio-me logo
à cabeça a imagem de Ascenso Ferreira sentado no Cais do Apolo disparando
versos que ricocheteavam na superfície das águas para afundar, mais adiante,
refletindo a luz prateada da lua cheia. E, quando vi a lua, não pude evitar de
ouvir os versos de Carlos Pena Filho, o poeta do Bar Savoy.
“Era uma lua tão grande
De tão
vermelha amplidão
Que mesmo
Ascenso Ferreira
Comendo só a
metade
Morria de
indigestão”
“Obrigado Severino, por me trazer essas
notícias porque há bem pouco tempo andei relendo poemas do Ascenso e topei com
aquele onde ele faz uma gozação aos gaúchos, lembra?”
GAÚCHO
Riscando os
cavalos
Tinindo as
esporas
Través das
cochilhas
Saí dos meus
pagos em louca arrancada
== Pra que?
== Pra nada,
“Apois, quando eu resolvi subir a Serra
me deu na veneta fazer uma paródia com os versos do Ascenso e, invertendo-lhe o
destino, voltei aos meus pagos.
VOLTEI AOS
MEUS PAGOS
Subindo a
Montanha
Tremendo de
frio
Cantando
louvores
Voltei aos
meus pagos
Em louca
empreitada
-- Pra que?
-- Pra vida encantada
E foi assim que nos sentimos, minha
esposa e eu, quando chegamos ao topo. Encantados.
Fomos alojados em um pequeno castelo,
pouco maior do que cinquenta metros quadrados, na beira da estrada que
atravessa o Mury em Nova Friburgo, cerca de cem metros do renomado Bistrô
Primavera, onde o chef Flamínio e sua esposa Adriana encantam seus fiéis
clientes com iguarias da cozinha internacional.
E o mundo Pandemônico em que vivemos
hoje tomou, para nós, um outro sentido. Adeus solidão opressiva. Adeus angústia
estressante. Adeus medos e suspeitas. Voltou a alegria, o bom humor e a
tranquilidade. E a beatitude das almas ingênuas.
Está aí uma demonstração do valor das coisas.
ResponderExcluirUm pequeno e simples chalé com valor de um castelo!
É assim que são os valores da vida, a felicidade não tem preço!
Pequenas coisas, grandes satisfações.
Tive o mesmo sentimento quando lia! Um pequeno chalé com o valor de um castelo!
ExcluirSimples e sincero. A Família é o melhor remédio. Até na minha assinatura tem o nome do meu filho que fez login no meu celular...
ResponderExcluirQue crônica emocionante. Achar o sentido das coisas, novos significados, novos olhares, faz tão bem a alma.
ResponderExcluirCom certeza, um pequeno castelo que se encherá de novas e belas memórias.
Que descrito!
ResponderExcluirCarregado de significados e emoções!
Abraça as árvores Severino, que elas hão de te ensinar a firmeza do pensar e do viver!
Obediente às dicas do autor, tratei de reler essa entusiasmante crônica que nos lembra a existência de lugares ainda possíveis no mundo e que a simplicidade não tem preço. E, quando podemos querer não devemos evitar em conquistar. Que bom que você pôde aproveitar essa oportunidade que se apresentou e, aproveitou! Maravilha! Sem dúvida, ao ler, dá vontade de estar aí!
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