Eu estava acostumado
com o nome da Schincariol na enorme placa da fábrica de cerveja por onde passo
toda a vez que desço a Serra para ir ao Rio. Desta vez foi diferente. A placa
havia dobrado de tamanho e dizia: Kirin Brasil. O nome Kirin me era familiar.
No Japão eu me havia acostumado a pedir uma “kirin biru” nos restaurantes,
quando queria tomar cerveja. “Biru” é a palavra criada no Japão para designar
“cerveja”, uma adaptação da palavra “beer”, do inglês, tornada pronunciável para
a articulação dos japoneses. O mesmo aconteceu com outras tantas palavras: sorvete, virou “aicicrimu” , como o verbo spinning (
fiar, em português) virou “supining” ... e... bem, não resisto, vou dizer o meu nome em japonês:
“Ruigi Superafico” , com uma pausa respiratória entre o u e o p. E Brasil virou “Brasiro”.
Bem vinda, Kirin biru ao nosso país! E obrigado por me trazer tantas recordações do
convívio que mantive com aquele povo educado e cordial, disciplinado,
trabalhador, estudioso e rigorosamente pontual, com quem tanto aprendi. Certa vez, numa viagem de trem que ia de
Osaka para uma pequena cidade do interior, paramos numa estação intermediária.
Haveria uma permanência de dez minutos, tempo suficiente para tomar uma cerveja
no pequeno quiosque instalado no meio da plataforma. Duas velhinhas, com um
sorriso perpétuo, atendiam. Quando você se afasta dos grandes centros, no
Japão, dificilmente encontra alguém que fale inglês. Imagine duas velhinhas.
Mas ali não havia problema. Bastava
dizer “kirin biru, kudasai” e elas entenderiam. De fato, imediatamente uma
latinha de kirin foi colocada sobre o
balcão. Eu queria um copo e como o meu japonês não ia além do “uma
kirin, por favor”, fiz o pedido em inglês. E depois em italiano e espanhol e
francês, sem resultado. As duas se entreolhavam e riam sem parar, balançando a cabeça, sem entender nada. Foi
quando se aproximou em colega de trabalho brasileiro que viajava comigo:
- Por que diabos você está gesticulando tanto, galego?
- Nada,
eu só queria um copo.
E a velhinha, arregalando os olhos, escancarando um riso de triunfo:
- Han? Copú? Hai, Hai ! – e tascou um copo no balcão.
Com suas conquistas no Oriente, Portugal
introduziu muitas palavras, não só no Japão, como em outros países. Foi assim
que pão virou “opan”, e chá virou
“ochá”. Na Indonésia sapato é “sapatú” e governo é “gubernúr”. Os espanhóis
também deixaram sua marca. Nas Filipinas eu acompanhava a conversa de dois
operários que falavam em tegalog, o
dialeto local, quando escuto:
- Que ura stá?
Interrompi a conversa e perguntei:
- Você
perguntou que horas são?
- Perfeitamente - foi
a resposta.
Ainda no Japão, assisti a uma cena divertida
e triste, numa loja de departamentos, em
Tókio.
Eu havia aprendido que na língua
japonesa não existe a frase interrogativa negativa. Portanto, se você perguntar: Você
não tem medo de chuva, tem? Em português
a resposta usual seria : Não! No Japão você
ouvirá: Sim! – ou seja, como você disse: “Sim, eu
não tenho medo de chuva”.
Eu estava na fila do caixa. Um americano
na minha frente entrega as mercadorias à mocinha e pergunta:
- “You have American Express, don’t
you”?
- “Yes”
- responde a menina. (sim, eu não tenho American Express)
O
Americano entrega o cartão. A menina olha, balança a cabeça e diz:
- “No”.
- “ But you said you have American Express, diden’t you”? – novamente a interrogativa negativa.
- “Yes” – responde a moça novamente. E o
americano, já gritando:
- “Than process it, please”. A moça olha
o americano, respira fundo, balança a cabeça e diz:
- “No”.
A cena que se seguiu foi patética. O
americano enfurecido começa a gesticular, chamando o gerente. A moça chora. Os
demais clientes olham atônitos, não entendem o motivo da fúria do americano.
Ele ameaça chamar o consulado americano... ela está me fazendo de palhaço...,
etc, etc... Tudo por causa de um “don’t you”.