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TENHO POR ELE O MAIOR RESPEITO. Sou cliente de banco desde 1952. Abri minha primeira conta no Banco Financial Novo Mundo. Ficava na Rua do Ouvidor, bem próximo da Avenida Rio Branco pelo lado de quem ia para as barcas. Nos dias de maior movimento, o tempo de espera para ser atendido era de dez minutos. Nos dias normais não passava de cinco. Eu entregava o cheque para ser descontado a uma donzela sempre sorridente, recebia uma ficha numerada, e me sentava num banco de madeira. Naquele tempo todos se sentavam, não só os velhinhos. O cheque viajava. Numa mesa conferia-se o preenchimento, noutra a assinatura, depois o saldo, e por aí vai, tipo corrida de revezamento. Mas, em menos de cinco minutos, meu número era chamado. Durante as décadas que se seguiram passei por muitos bancos. E continuo dependendo deles para sobreviver. Como poderia receber a generosa recompensa que o Sistema Previdenciário me proporciona (depois de ter contribuído a vida inteira pelo teto máximo e ser recompensado pelo mínimo, o que, pelos meus cálculos atuariais, me obrigaria a viver 125 anos para recuperar o que lá enterrei)? Como poderia pagar contas, declarar imposto de renda e efetuar tantas outras operações burocráticas que a vida moderna nos impõe, sem a proteção magnânima de um banco? Continuo, portanto, dedicando uma parte considerável do meu tempo e, principalmente, da minha energia aos bancos. Mencionei o tempo, mas devo ser justo: o tempo gasto nas filas de banco até tem diminuído. Não graças aos terminais eletrônicos, que foram colocados inteligentemente do lado de fora, mas, graças à internet. Porque quando criaram os terminais, os bancos criaram também as filas dos terminais, as quais resultaram maiores que as filas dos caixas. E criaram também a curiosa figura da funcionária que percorre a fila dos caixas com a penosa missão de deslocar o cliente dali para o lado de fora. - Posso ajudar, vai fazer algum pagamento? Por que não usa o terminal? - Porque a fila de lá está maior do que esta. Cansado de dar explicações sobre as minhas preferências pessoais no que se refere ao sofrimento humano, decidi livrar-me do incômodo de uma vez por todas: - Posso ajudar, vai fazer algum pagamento? Por que não usa o terminal? - Só respondo na presença do meu advogado! Certa vez descobri que podia dar uma contribuição ao Departamento de Marketing do meu banco. Eu estava no balcão, esperando ser atendido, quando uma graciosa donzela (igual à do meu tempo do Financial, justiça seja feita) aproximou-se, e, reconhecendo-me, atacou: - Senhor Luigi, que bom encontrá-lo! Eu vi que o senhor não tem um seguro com a gente. O senhor precisa fazer um seguro! - Por que eu deveria fazer um seguro? - Ora, porque se o senhor vier a faltar, que Deus o livre, os seus filhos ficarão protegidos. - E como é que eles vão ficar protegidos se eu não vou estar aqui para protegê-los? - Veja: o senhor paga o seguro, mensalmente, de tanto, e se o senhor vier a falecer, que Deus o livre, os seus filhos vão receber tanto e tanto pelo seguro. Entendeu? - Não. Deixe-me ver. Eu pago, mensalmente, um tanto, durante tanto tempo, e, pelo tanto que eu ainda pretendo viver vou ter que desembolsar um tanto considerável da minha magra aposentadoria justamente quando, pelas deficiência da idade, mais preciso dela. E aí, quando eu morrer, eles vão receber essa bolada toda e gozar a vida? Não, decididamente tem alguma coisa errada nisso. - Mas é assim que funciona, Seu Luigi! - Não, não. Se você quiser fazer um seguro comigo, você tem que fazê-lo em nome do meu pai. Em nesse caso, eu pagarei a mensalidade, não ele. Aí, sim, quando ele morrer eu é que entro na bolada. É justo. Fui eu que paguei por ela. Dessa forma eu faço o seguro. Os olhos da moça brilharam. Logo puxou um formulário e gritou: - Perfeito! Como é o nome dele? - Guglielmo... g, de Gaspar, u, de Urbano.... - Casado ou solteiro? - Viúvo. - Local de nascimento? - Villa Bartolomea, província de Verona, Italia. - Data de Nascimento? - 28 de Janeiro de 91. - Como 91? - Ah! Desculpe, 1891. - Como? Quantos anos ele tem?! - Não sei, preciso fazer as contas. Acho que dá ... 95. - Ah! Mas assim não pode! Meu pai morreu com 101 anos. Não fez o seguro nem eu recebi a bolada. Mas foi o banco que não quis.
TENHO POR ELE O MAIOR RESPEITO. Sou cliente de banco desde 1952. Abri minha primeira conta no Banco Financial Novo Mundo. Ficava na Rua do Ouvidor, bem próximo da Avenida Rio Branco pelo lado de quem ia para as barcas. Nos dias de maior movimento, o tempo de espera para ser atendido era de dez minutos. Nos dias normais não passava de cinco. Eu entregava o cheque para ser descontado a uma donzela sempre sorridente, recebia uma ficha numerada, e me sentava num banco de madeira. Naquele tempo todos se sentavam, não só os velhinhos. O cheque viajava. Numa mesa conferia-se o preenchimento, noutra a assinatura, depois o saldo, e por aí vai, tipo corrida de revezamento. Mas, em menos de cinco minutos, meu número era chamado. Durante as décadas que se seguiram passei por muitos bancos. E continuo dependendo deles para sobreviver. Como poderia receber a generosa recompensa que o Sistema Previdenciário me proporciona (depois de ter contribuído a vida inteira pelo teto máximo e ser recompensado pelo mínimo, o que, pelos meus cálculos atuariais, me obrigaria a viver 125 anos para recuperar o que lá enterrei)? Como poderia pagar contas, declarar imposto de renda e efetuar tantas outras operações burocráticas que a vida moderna nos impõe, sem a proteção magnânima de um banco? Continuo, portanto, dedicando uma parte considerável do meu tempo e, principalmente, da minha energia aos bancos. Mencionei o tempo, mas devo ser justo: o tempo gasto nas filas de banco até tem diminuído. Não graças aos terminais eletrônicos, que foram colocados inteligentemente do lado de fora, mas, graças à internet. Porque quando criaram os terminais, os bancos criaram também as filas dos terminais, as quais resultaram maiores que as filas dos caixas. E criaram também a curiosa figura da funcionária que percorre a fila dos caixas com a penosa missão de deslocar o cliente dali para o lado de fora. - Posso ajudar, vai fazer algum pagamento? Por que não usa o terminal? - Porque a fila de lá está maior do que esta. Cansado de dar explicações sobre as minhas preferências pessoais no que se refere ao sofrimento humano, decidi livrar-me do incômodo de uma vez por todas: - Posso ajudar, vai fazer algum pagamento? Por que não usa o terminal? - Só respondo na presença do meu advogado! Certa vez descobri que podia dar uma contribuição ao Departamento de Marketing do meu banco. Eu estava no balcão, esperando ser atendido, quando uma graciosa donzela (igual à do meu tempo do Financial, justiça seja feita) aproximou-se, e, reconhecendo-me, atacou: - Senhor Luigi, que bom encontrá-lo! Eu vi que o senhor não tem um seguro com a gente. O senhor precisa fazer um seguro! - Por que eu deveria fazer um seguro? - Ora, porque se o senhor vier a faltar, que Deus o livre, os seus filhos ficarão protegidos. - E como é que eles vão ficar protegidos se eu não vou estar aqui para protegê-los? - Veja: o senhor paga o seguro, mensalmente, de tanto, e se o senhor vier a falecer, que Deus o livre, os seus filhos vão receber tanto e tanto pelo seguro. Entendeu? - Não. Deixe-me ver. Eu pago, mensalmente, um tanto, durante tanto tempo, e, pelo tanto que eu ainda pretendo viver vou ter que desembolsar um tanto considerável da minha magra aposentadoria justamente quando, pelas deficiência da idade, mais preciso dela. E aí, quando eu morrer, eles vão receber essa bolada toda e gozar a vida? Não, decididamente tem alguma coisa errada nisso. - Mas é assim que funciona, Seu Luigi! - Não, não. Se você quiser fazer um seguro comigo, você tem que fazê-lo em nome do meu pai. Em nesse caso, eu pagarei a mensalidade, não ele. Aí, sim, quando ele morrer eu é que entro na bolada. É justo. Fui eu que paguei por ela. Dessa forma eu faço o seguro. Os olhos da moça brilharam. Logo puxou um formulário e gritou: - Perfeito! Como é o nome dele? - Guglielmo... g, de Gaspar, u, de Urbano.... - Casado ou solteiro? - Viúvo. - Local de nascimento? - Villa Bartolomea, província de Verona, Italia. - Data de Nascimento? - 28 de Janeiro de 91. - Como 91? - Ah! Desculpe, 1891. - Como? Quantos anos ele tem?! - Não sei, preciso fazer as contas. Acho que dá ... 95. - Ah! Mas assim não pode! Meu pai morreu com 101 anos. Não fez o seguro nem eu recebi a bolada. Mas foi o banco que não quis.