Acabo de receber um livro que comprei pela internet. Foi editado em 1930. Procurei-o em um sebo porque eu o havia lido aos treze anos de idade e nunca mais havia ouvido falar dele. O papel é áspero e está amarelado pelo tempo, cheio de manchas escuras causadas, provavelmente, pela acidez do papel.
Tenho também um exemplar da Divina Comédia em italiano, edição de 1811, em formato pequeno, com 615 páginas. O papel é de um branco impecável, e nele se notam as ondulações dos cilindros que laminavam a pasta de celulose, tecnologia usada na época. São livros de papel. Merecem ser tratados com carinho. Porque o papel está sendo substituído.
A cada dia, livros e mais livros são editados em telas de computador. Há quem diga que os livros de papel estão com os dias contados. Outros garantem que não. Não vou meter-me a discutir as vantagens ou defeitos de um e de outro, pois me falta preparo técnico para tanto. Umberto Eco, o grande filólogo, fez isso de maneira magistral em duas obras: “A memória vegetal” e “Não contem com o fim do livro”. No primeiro, ele explica como a humanidade registrou suas memórias desde o tempo do papiro e analisa a efemeridade do papel como meio para preservar a informação. No segundo, escrito em parceria com Jean-Claude Carrière, escritor e roteirista de cinema, ele discute os méritos do livro de papel em confronto com os meios eletrônicos para a divulgação de textos. O resultado desse debate está contido no próprio título do livro.
Mas eu não vim aqui para chorar a morte do livro de papel, assunto que deixo para os filólogos. Eu vim chorar a morte do papel como papel. Porque o papel está sendo substituído. Na correspondência, onde se produziram notáveis obras literárias, as cartas não são mais de papel.
São telas de computador e não sei se estas conseguirão transmitir as esperanças, as angústias, os medos, as alegrias e as tristezas como uma caligrafia trêmula, ou uma palavra borrada por uma lágrima caída sobre o papel conseguem transmitir à mulher amada, ao amigo distante, ao avô esquecido.
Boletins, editais, manifestos, concorrências públicas, propostas comerciais, teses de doutorado e até notas fiscais não são mais feitas em papel. Procure-as no www.com .
As cômodas e higiênicas bolsas de papel com as quais se faziam compras no supermercado foram substituídas por sacolas de plástico. O dinheiro, que se chamava papel moeda, não é mais de papel. Foi substituído por um cartão de plástico ou por números armazenados num servidor eletrônico. Nada contra. Mas rezo aos céus que me poupem dos raios e trovões, eles que já me destruíram uma árvore imensa e uma máquina de quase cem quilos de peso.
Não quero me alongar na busca de exemplos para a substituição do papel, pois não consigo conter minha ansiedade.
O que eu quero ver é como vão substituir o papel higiênico.
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