04 junho 2022

ONDE ESTÁ O MEU ABRAÇO ?

Venho insistindo que a Pandemonia,  sem acento nem endereço, provocou importantes alterações no comportamento humano. O confinamento das pessoas devido ao risco de contàgio por Covid, exacerbou o comportamento das pessoas não só entre amigos e conhecidos mas, também, dentro da própria família. E começaram a se agravar os sintomas de depressão, ansiedade, estresse, medo, angústia, insônia, ciúmes, sem falar na contribuição que um psicólogo poderia acrescentar a essa lista.

Encontrei, na forma de um poema, um verdadeiro hino à esperança. Foi escrito por Antonio Roberto Fernandes, um modesto poeta do interior, Ele me deu a certeza de que eu terei um motivo para acordar no dia seguinte.  

 

Mas

                                                                          Antonio Roberto Fernandes

E eu que achei que a lua não brilhasse

sobre os mortos no campo da guerrilha,

sobre a relva que encobre a armadilh

ou sobre o esconderijo da quadrilha,

Mas brilha.

 

E achei que nenhum pássaro cantasse

se um lavrador não mais colhe o que planta,

se uma família vai dormir sem janta

com um soluço preso na garganta.

Mas canta.

 

Também pensei que a chuva não regasse

folha cujo leite queima e cega

a carnívora flor que o cego inseto pega

ou o espinho oculto na macega,

Mas rega.

 

Pensei também que o orvalho não beijasse

a venenosa cobra que rasteja

no silêncio da noite sertaneja

sobre a ruína de esquecida igreja,

Mas beija.

 

 Imaginei que a água não lavasse

 o chicote que em sangue se deprava

 quando, de forma monstruosa e brava,

 abre trilhas de dor na carne escrava

 Mas lava.

 

 Apostei que nenhuma borboleta

 ­por ser um vivo exemplo de esperança

dançaria contente, leve e mansa

sobre o túmulo em flor de uma criança,

Mas dança.

 

 Por isso achei que eu não mais fizesse

 poema algum após tanto embaraço,

 tanta decepção, tanto cansaço

 e tanta espera, em vão, por teu abraço,

 Mas faço.